Transferência metálica no processo de soldagem a arco submerso (SAW)

Eng.º Pedro Menezes
Diretor da MB.WeldWorks
Alexandre Bracarense, PhD.
Diretor da MB.WeldWorks

 

O modo com que o metal fundido, na ponta do eletrodo, se transfere para a poça de fusão é um fator importante para a operacionalidade nos processos de soldagem a arco elétrico. A transferência metálica influência no formato do cordão de solda, na geração de respingos, fumos e defeitos, na estabilidade do processo e na possibilidade de soldagem fora da posição plana. Respingos, normalmente, não são problema na soldagem a arco submerso (SAW) e a limitação da soldagem fora da posição plana é inerente ao próprio processo. Apesar disto, defeitos e variações dimensionais no cordão de solda pode ser um grande problema.

O Instituto Internacional de Soldagem (IIW) desenvolveu uma classificação de transferência metálica para diferentes processos de arco elétrico, como pode ser observado na Tabela 1.

 

Tabela 1 – Classificação do IIW de transferência metálica em soldagem a arco. Adaptado de [1].

Tipo de transferência

Processos de Soldagem (Exemplo)

Transferência por queda livre (Free Flight Transfer):

 

 

Globular (Globular)

 

        –Globular (Drop)

GMAW com baixa corrente

        –Repelida (Repelled)

GMAW com proteção gasosa por CO2

Goticular ou Aerosol (Spray)

 

         -Axial (Projected)

GMAW com corrente intermediária

         -Alongamento (Streaming)

GMAW com corrente média

         -Rotacional (Rotating)

GMAW com corrente elevada

         -Explosiva (Explosive)

SMAW

Por contato (Bridging Transfer):

 

Curto-circuito (Short-circuinting)

GMAW com menor comprimento de arco

Sem interrupção (Without Interruption)

GTAW com alimentação continua de arame

Protegida por escória (Slag Protected Trasnfer):

 

 

Guiada pela escória (Flux-Wall Guided)

SAW

Outros modos (Other modes)

SMAW, FCAW, ESW, etc.

 

 

De acordo com o IIW, o tipo de transferência no processo SAW é classificada como transferência protegida e guiada pela escória. Porém, Mendez et al. (2015) [2] afirma que devido ao arco elétrico estar sob uma camada de fluxo, o modo de transferência ainda não é completamente conhecido como nos outros processos. Esta dificuldade no entendimento dos modos de transferência pode até ser um fator limitante no desenvolvimento de equipamentos mais modernos, que possam melhorar o controle de fenômenos indesejáveis neste processo de soldagem.

Mendez et al. (2015) [2] utilizou uma câmera de alta velocidade com uma taxa de aquisição de 10.000 frames por segundo, com o objetivo de observar o arco elétrico e a transferência metálica no interior da camada de fluxo, por meio de um tubo de aço carbono. O tubo foi colocado transversalmente a solda e, desta forma, foi possível observar a transferência metálica quando o arco elétrico passava pelo tubo. No trabalho foram realizados cordões sobre chapa com correntes de soldagem de 500 A e 1.000A polaridade inversa (corrente contínua com eletrodo no positivo) e 500 A com corrente alternada (AC).

 Com corrente de soldagem de 500 A, tanto a polaridade inversa, quanto AC, foi observada uma transferência de metal do tipo globular não axial, muito caótica, envolvendo explosões frequentes. Na Figura 1, pode-se observar a transferência metálica para a corrente de 500 A na polaridade inversa. Para a corrente de 1.000 A, observou-se uma conicidade na ponta do eletrodo, algo semelhante a uma instabilidade eletromagnética, como acontece no processo GMAW com modo de transferência spray. Também, observou-se um arco elétrico “enterrado”, como pode ser observado na Figura 2.

 


Figura 1 – Imagens da transferência metálica do processo SAW obtidas quando o arco elétrico passa sobre um tubo de aço. Corrente de soldagem de 500 A em polaridade direta. Tempo total de aquisição de 0,09 segundos. Adaptado de [2].

 

Figura 2 – Imagens da transferência metálica do processo SAW obtidas quando o arco elétrico passava sobre um tubo de aço. Corrente de soldagem de 1000 A e polaridade direta. Tempo total de aquisição de 0,014 segundos. Adaptado de [2].

 

Apesar dos resultados serem muito interessantes, quando o arco elétrico passa pelo tubo, ocorre uma mudança nas condições de operação, podendo observar estas mudanças através dos sinais elétricos e na morfologia do cordão de solda. Desta forma, não se sabe se a transferência metálica sem o tubo, realmente, seria da maneira observada.

Outros autores têm buscado formas alternativas de avaliar a transferência metálica no processo SAW. Por exemplo, Li et al. (2017) [3], além de um tubo de aço com uma câmera de alta velocidade e análise conjunta dos sinais elétricos, como no caso anterior, estes autores propuseram um modelo físico para explicar a transferência metálica. O modelo físico consiste em um cateter com leite fluindo através do mesmo. O leite simulava o metal líquido durante a transferência metálica, um vidro esférico conectado ao cateter simulava a parede de fluxo e um bocal, colocado na parte debaixo, simulava a força eletromagnética do arco sobre o metal liquido na ponta do eletrodo, através da ejeção de ar. Este modelo físico pode ser observado na Figura 3.

 

 

Figura 3 – Modelo físico simulando a transferência metálica no processo SAW. Adaptado de [3].

 

Li et al. (2017) [3] sugeriram ainda que pode haver três diferentes modos de transferência no processo SAW. Em corrente mais baixa, a transferência globular repelida sem a presença de curto-circuito. Em correntes intermediarias, a gota pode ser repelida para a parede de fluxo, ocasionando uma transferência guiada pela parede de fluxo, sem a presença de curto-circuito. Em correntes mais altas, a gota pode fluir de modo continuo pela parede de fluxo, ocasionado a ocorrência de curtos-circuitos e arco elétrico ao mesmo tempo. De acordo com os autores [3], as sugestões de transferência metálica têm uma relação com o comportamento dos sinais elétricos e com a observação da transferência metálica pelo tubo de aço carbono, sendo um modelo, consideravelmente, confiável. Porém, acredita-se que mais estudos e análises são necessários para buscar melhores entendimentos dos modos de transferência metálica no processo SAW.

 

 

Revisões bibliográficas

[1] MODENESI, P. J. Introdução à Física do Arco Elétrico e sua Aplicação na Soldagem dos Metais. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais. Apostila da disciplina de Física da Soldagem, 2015.

[2] MENDEZ, P. F.; GOETT, G.; GUEST, S. D. High-Speed Video of Metal Transfer in Submerged Arc Welding. Welding Journal. 94, p.326-333, 2015.

[3] LI, K.; WU, Z.; ZHU, Y.; LIU, C. Metal transfer in submerged arc welding. Journal of materials processing technology. 244, p. 314-319, 2017.